quinta-feira, 13 de setembro de 2012

"Vai estudar ó Relvas"


Aqui raramente escrevemos sobre política, mas hoje abrimos uma excepção já que não vamos escrever sobre Timor, mas sim sobre Portugal. E ainda porque, mais do que política em sentido estrito, trata-se de dissertar um pouco sobre os limites à expressão de opiniões políticas em território estrangeiro.

Vem este assunto a propósito da visita de Miguel Relvas a Timor-Leste e da colocação da faixa da polémica.

Relvas veio em visita oficial a Díli para assinar um protocolo de cooperação na área da comunicação social e participar nas comemorações do Dia da Consulta Popular. Para recebê-lo, alguém mandou colocar uma faixa com os dizeres “Vai estudar ó Relvas” numa das principais ruas de Díli, mesmo em frente ao Hotel Timor, onde a sua comitiva ficou instalada. A propósito desta faixa muito se disse e escreveu e agora que os ânimos já refrearam chegou a nossa vez.

Primeiro, há que contextualizar. Miguel Relvas é o actual Ministro dos Assuntos Parlamentares no governo de coligação PSD-CDS liderado por Pedro Passos Coelho. Em Setembro de 2006, requereu a sua admissão à Universidade Lusófona. Em Outubro de 2007, concluiu a licenciatura em Ciência Política e Relações Internacionais. A Universidade ponderou a sua experiência profissional e percurso académico e concedeu-lhe nada mais do que 32 equivalências, pelo que o aluno teve apenas de fazer exames a quatro disciplinas e pôde concluir a licenciatura num ano! Não há registos conhecidos doutro aluno a quem tenham sido dadas tantas equivalências quer naquela, quer em qualquer outra universidade. O caso cheira a esturro e deu origem a alguma contestação.

Segundo, há que esclarecer que esta não é a primeira vez que Miguel Relvas recebe tal conselho. Já no Tour de França e na maratona dos Jogos Olímpicos de Londres tinham surgido cartazes com a mesma mensagem.

Em nossa opinião, este gesto de protesto é simplesmente hilariante! É uma forma de criticar pacificamente sem entrar em ofensas gratuitas, de demonstrar que alguns Portugueses não esquecem e não pactuam com a desonestidade que prolifera na nossa classe política (e já agora, na académica também). Tudo com uma boa dose de humor! O conselho é sensato e a frase fica no ouvido!

Mas claro que as reacções divergiram e por aqui muitos foram aqueles que se mostraram preocupados com o impacto desta acção junto dos timorenses e com o desprestígio que é “lavar a roupa suja” fora de fronteiras (vozes às quais se juntaram outras ainda mais ortodoxas, que exigiam uma investigação à identidade do autor da brincadeira como se algum crime tivesse sido praticado).

Claro que concordamos que as críticas devem ser sobretudo feitas dentro de fronteiras, mas não as territoriais e antes as da razoabilidade. É que sejamos claros, trafulhice é trafulhice, aqui ou em Lisboa, e não vemos qualquer razão objectiva para reservar as acções de protesto para “dentro de casa”. Há Portugueses espalhados por todo o mundo e também esses têm o direito (o dever, diriamos) de expressar a sua opinião sobre o que se vai passando em Portugal quando a oportunidade assim surge. Se é legítimo que celebremos aqui, em território estrangeiro, o 10 de Junho, também tem de ser legítimo que aqui demonstremos o nosso descontentamento político.

Para nós, o factor territorialidade não serve para desculpar falhas de carácter nem de conduta. Não é por sermos Portugueses e estarmos fora de Portugal que vamos fechar os olhos a estes esquemas que já cansam e fazer sorrisos amarelos à passagem de personalidades públicas portuguesas (políticos ou não) que só nos envergonham. Desculpem-nos esses Portugueses, mas não contem com o nosso apoio nem aqui, nem em qualquer outro lado.

E também é verdade que a maioria dos timorenses que viu aquela faixa não sequer sabe quem é Miguel Relvas, e por essa razão a mensagem não suscitou qualquer reacção junto da população local. Em relação à minoria que sabe quem ele é, ficou também a saber que há Portugueses que se envergonham das atitudes oportunistas de alguns dos seus políticos e que manifestam a sua opinião de forma civilizada e democrática, dentro e além fronteiras, sem necessidade de andar à pedrada.

Por todas estas razões, não temos dúvidas que o maior impacto da faixa foi precisamente junto da comunidade portuguesa.

E para nós a mensagem é tão simples: queremos políticos com sentido de causa pública e sobretudo com vergonha na cara (ser licenciado não é requisito)! Todos os outros estão dispensados.

(E sim estamos a escrever isto dalém-fronteiras para quem nos quiser ler porque o exercício da nossa liberdade de expressão não se confina (não se pode confinar) aos limites de qualquer território nacional. Aos críticos pró-fronteiras deixamos uma questão final: quando partilham as vossas opiniões políticas num qualquer mural do Facebook acham que elas viajam até onde?)

Faixa colocada no centro de Díli, em frente ao Hotel Timor

1 comentário:

  1. RELVAS e a sua imagem de marca nos últimos tempos. ahah Acho lindo. ;)

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